“Olá, GUARDADOR de rebanhos,
Aí à beira da estrada,
Que te diz o vento que passa?”
“Que é vento, e que passa,
E que já passou antes,
E que passará depois,
E a ti o que te diz?”
“Muita cousa mais do que isso.
Fala-me de muitas outras cousas.
De memória e de saudades
E de cousas que nunca foram”
“Nuca ouviste passar o vento.
O vento só fala do vento.
O que lhe ouviste foi mentira,
E a mentira está em ti”
“Aí à beira da estrada” a palavra “aí” sugere o distanciamento que as vozes querem
manter do guardador de rebanhos, como se elas desfrutassem de um status superior ao dele e
não quisessem se misturar.
“Que te diz o vento que passa?” Considerando que o vento não fala, essa pergunta é
uma zombaria, gozação, desrespeito com a condição humilde do guardador; este verso deixa subentender que as vozes nada sabem sobre um homem em contato com a natureza; não
sabem que a vivência dele o faz ler dentro dos componentes da natureza.
Na terceira estrofe, essas vozes se manifestam pedantes rançosas: utilizam-se três
vezes da palavra “cousas”, um termo em desuso para induzir erudição.
A afirmação “muito mais do que isso” é ostentação, querer se colocar acima, num plano
de cultura superior; no entanto, as afirmações seguintes são vazias, sem qualquer conteúdo
e terminam a estrofe quase com uma evasão, indicando que elas não conseguem sustentar uma seqüência lógica“ com a expressão: “cousas que nunca foram”; não sabem o que afirmam.
O guardador, no entanto, indica qual é o conteúdo delas: a mentira, fantasia, vaidade, vulgaridade; tudo isso “está em ti”; está nelas que assim agem em todas as situações.
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