quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Luz e Sombra - I (Em 23/02/2007)

Nasceu a Manuela, a netinha do Simões.

O Simões, além de ser talento, é um místico. Nós pensamos que este mundo está perdido; não conhecemos homens como o Simões; o Simões é um ser humano que nos dá exemplo de abdicação de seriedade, na busca obstinada de fazer a coisa com perfeição. Simões é um mestre de se soltar de si mesmo; Simões é coragem viva.

Do nascimento da Manuela, ele me escreveu que ficou feliz também com o nome e me cobra uma resposta: por que tanta alegria na chegada e a tristeza na saída? Responda, diz ele. Simões trem vivência nesses dois estágios de sua via crucis.

E fico me remoendo nesta cadeira, sem encontrar uma brecha com que atender meu velho amigo de tantas discussões. O Simões entrava na sala e a discussão pegava fogo, sempre em torno de temas sobrenaturais. Parecia que ele já vinha munido dos meios com que me aguçar o debate. Simões conhece meus pontos fracos. Se vire, responda.

Esse jogo de entrada e saída é de predominância dos órgãos dos sentidos: nós queremos ver, ouvir, apalpar. Quando essas exigências não são satisfeitas, vem a instabilidade. Se o filho, a filha fica um tempo sem comunicação e sem prévio aviso, entramos em parafuso; se telefona, se o ouvido identificou sua voz, é o alívio, as tensões se diluem.

No caso da ida sem retorno, nós nos desesperamos por três motivos:

- temos consciência de não mais vermos o que víamos,

- o que estamos vendo já não é o que víamos,

- consciente ou inconscientemente, nós nos projetamos naquela situação.

Despedir-se é um exercício de despreendimento, sobretudo quando essa despedida é a última. Acontece que não estamos preparados para nos despreender; na dor da perda, um nível de inconsciência parece transmitir aos sentidos a mensagem, mas eles não-na compreendem; descontrolamo-nos, porque a realidade está ali desfigurada, já não é o que víamos, limitada apenas à visão; é o que sobrou do que os sentidos conheciam.

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