Recebi uma dura lição de vida daquela moça; ela era de uma beleza apurada: morena, traços finíssimos, cabelos ondulados de uma delicadeza austera que só as deusas iluminadas podem ostentar; portadora de uma mensagem. Falávamos sobre Goethe de quem ela queria representar um texto em classe; beleza sobre todos os títulos. Marcado o dia, ela acrescentou “se eu puder vir apresentar”.
Eu não podia conceber aquele “se”; uma vez assumido o compromisso, era cumprir o trato e pronto. Foi quando ela se justificou: tomava remédios fortíssimos para manter de pé a vida, cujo fim já se prenunciava irreversível. E acrescentou ainda essas palavras que me ficaram como marca do feminino em minha vida.
- professor, eu passo pela rua e os homens olham pra mim e fazem cogitações de natureza
vária; mal sabem que, por trás dessas curvas, esconde-se o Corvo de Allan Poe.
Conhece o poema de Allan Poe? Sobre o corvo que entra no gabinete do poeta e, por maior que seja o esforço de tirá-lo dali, o corvo responde sempre “never more”, “never more”. Nunca mais, nunca mais. Êta moça culta!
Fez a apresentação brilhante, despediu-se de todos e foi buscar recuperação em outro país, sem sucesso.
Daquela moça tenho ainda a imagem em minhas retinas; de quando em quando, ela me vem à tona, como um chamado, uma advertência, um sinal de mudança? Não sei; sei que ela é uma beleza que permanece motivando meus dias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário