Tenho escrito sobre as menininhas vítimas de opressão e me deparei com uma situação alvissareira. Confesso que fiquei emocionado.
Passando pelos canais, vi um menino fazendo demonstração sobre raiz quadrada e cúbica, com a facilidade de quem anda; incrível! Terminou e a apresentadora anunciou uma menininha 7 anos, segundo ano fundamental. Veio a menininha e deu uma resposta que me comoveu sobremaneira:
- com quem você aprendeu geografia?
- eu aprendi sozinha e com meu pai.
- e o material, como você conseguiu?
- nós achamos no lixo um Atlas.
Pois é. Aquela menininha achou no lixo o material de que se utilizou para responder perguntas sobre:
Capitais dos países do mundo.
Expansão territorial de cada país.
Número de habitantes de cada país.
Diferença de fuso horário com o Brasil.
E, enquanto ela respondia com precisão matemática, parecia dizer-me:
- veja, não fique triste, umas vão outras vêm como eu assim dotada; eu sou a que foi; a que foi está em mim.
Refugiei-me nos adeptos dos quanta que apregoam a existência do um; tudo são partículas, tudo é um. Mas essa gente é extremamente culta e eu não alcanço essas grandezas minúsculas. Nem sequer entendo aonde aquela menininha foi beber água com que me umedecer os olhos.
Gente, aquele saber nasceu de achar no lixo um veículo de que ela fez estudo!
Aquela menininha de cabelinho espinhado que lhe prolongava a cabecinha para trás era atarracada, nascida em algum gueto veio me trazer sua luz, eu percebi. Se não entendi é porque ainda não estou preparado para esse mundo de minúsculas grandezas que só se irradiam dos corações vazios de tudo, como o daquela menininha, acostumados a catar lixo e distribuir a luz.
Gente, eu vi Deus; era uma coisinha. Deus tinha os traços de pobreza, um peitinho ligeiramente saliente intumescido por uma possível bronquite crônica, mas de muitas esferas. Aquilo era Deus falando pela memória que é a linguagem do povo. Aquilo foi demais para o meu pobre saber que não sei nada.
Deus só vê o lado positivo; nada sabe sobre o que é uma boneca pendurada simulando o sacrifício da inocência. Deus só sabe entrar em menininhas e desafiar nossa tradição. Assim não vale!
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