segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Carta ao Eugênio - normose - 4/4 ( Em 29/02/2008 )

Meu prezado Eugênio, li com atenção o texto que você me fez o favor de mandar, escrito pela jornalista Martha Medeiros e concernente à palavra normose, no âmbito social. Ele me ajuda a sustentar a diferença do que seja o lado de fora e o lado de dentro de nós mesmos.
Segundo a articulista, “todo mundo quer se encaixar num padrão. Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar. O sujeito 'normal' é magro, alegre, belo, sociável, e bem-sucedido. Quem não se 'normaliza' acaba adoecendo. A angústia de não ser o que os outros esperam de nós gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações de não enquadramento. A pergunta a ser feita é: quem espera o que de nós? Quem são esses ditadores de comportamento a quem estamos outorgando tanto poder sobre nossas vidas”?
O ditador é um só Eugênio: o dinheiro; já não se usa mais a palavra burguesia; parece que se tornou antiquada, demodé; mas a classe que ela representa continua atuando nos bastidores, manipulando as classes, tornando-as ocas. Veja um aspecto burguês: um jornalista afirma que os nova-iorquinos estão discutindo o que é melhor: tomar vinho francês ou californiano: decidiram que é melhor tomar vinho francês porque vem de navio; enquanto o da Califórnia vem de caminhão e polui mais o planeta; a idéia parece generosa, mas observe que os burgueses não se eximem de tomar o vinho.
Há um outro aspecto Eugênio amigo, a palavra normose cabe bem naquilo que se costuma dizer: “Maria vai com as outras”. Ou vai ou é descartada; essa é a lei vigente na sociedade do dinheiro.
Esse sufixo –ose, entre diversas significações, quer acrescentar algo que falta no desequilíbrio de um órgão; como a palavra foi aplicada a um comportamento social, deduzimos que a sociedade tem falta de algo, está em desequilíbrio e busca compensação no modismo, na cópia, nos estereótipos.
Você vai se conscientizando do que seja esse lado de fora de nós.
Parece que a imitação, esse nivelar por baixo, já faz parte de nossas tendências inconscientes; eu já encontrei isso num bairro bem distante, no fundo da periferia da capital, lá pelos anos 70, a televisão ainda era em branco e preto.
Lecionava num bairro distante, num tempo e lugar em que o  professor tinha de ser catequizador. Lembrando que a “escola para todos” tinha começado em 1967.  Lecionava cantando músicas de nosso folclore, visando a motivar aquela gente.
Se havia um desfile de moda em Paris, dois três dias depois as meninas daquele bairro, sem qualquer instrução, aquelas meninas, 2, 3 dias depois, apareciam vestidas com os decotes, as saias cada vez mais subidas, baseadas no que viram pela televisão desde Paris.
Hoje os grandes desfiles estão aqui; até há pouco, gerando bulimias e depressões, a que a moça se refere; as  grandes vitrines e nas pequenas lojas da periferia; os cortes de cabelo, as golas e vai por aí.
E vamos nos firmando no que seja o lado de fora de nós mesmos e o que encontramos de fútil no âmbito do movimento; pelo lado de fora, somos massa; a essa massa é fornecido um modelo de que não se pode desvencilhar, sem ser rejeitado pelo grupo. Lembra do Mack Luhan? Ele dizia que o mundo é uma aldeia global.  Ela nos mantém sempre subordinados a um cacique de cara e coroa; o que vale é transformar o povo em cara apenas massificado, porque a massa não raciocina; é mais fácil de conduzi-la.
Você decerto percebe que nosso empenho deve ser o de escaparmos desse círculo vicioso e viciado; situar a pessoa humana num ponto cada vez mais distanciado desse que a burguesia prepara para segurar os incautos e inchar os cofres.
O melhor lugar é dentro de nós mesmos Eugênio. Ficar à margem desses ditames que a sociedade do dinheiro impõe pelo glamour, embevecendo-nos os olhos.
Eu prefiro ficar com a articulista; ela está à procura de quem nos ajude a “remover obstáculos mentais e emocionais”; também eu estou empenhado nessa procura e o continuarei enquanto puder contar com a paciência de meus leitores, entre os quais incluo você. Obrigado Eugênio. Fique com Deus.

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